sábado, 24 de março de 2018

Dylan, millennials e semanas

Antes de abordar a questão que me levou a escrever este post, queria só referir que foi com muita pena que decidi não assistir ao concerto de anteontem de Bob Dylan no Pavilhão Atlântico.

Desde 2000 vi Joe Cocker, Eric Clapton, Supertramp, o concerto de 25 anos de carreira de Rui Veloso, Doors of The 21st Century, Roger Waters, Dave Matthews Band e depois de muita frustração após repetidas tentativas a achar "ok, há uns concertos com melhor som que outros e até pode ser dos sítios de onde tenho escolhido assistir" e de ter visto de vários ângulos e em vários níveis, decidi irrevogavelmente deixar de ir ver concertos naquele sítio manhoso!

Em 2011 engoli o que tinha dito porque era outro concerto de Roger Waters, celebrando um aniversário redondinho do The Wall, e por a logística que o acompanha ser, de facto, diferente. A equipa técnica do Waters posta na colocação de colunas de som no tecto e num sistema de surround que consegue minimizar o efeito que aquelas traves de madeira no tecto, as paredes e toda a estrutura elíptica do edifício que provoca aquele 'efeito tipo bola'. Mas desde 2011 que não ponho lá os pés!

Ontem li uma fantástica crónica do concerto por um amigo músico que assistiu ao vivo...

"Bob Dylan é quase uma distopia dele próprio e dos mitos à sua volta. Se quisessem ouvir as versões dos discos, bastava ficarem à porta a ouvir os imitadores, que soam mais como o senhor que ele próprio. Lá dentro, a conversa é outra. As músicas mais conhecidas transformam-se nas mais irreconhecíveis, sinal de arrogância para alguns, liberdade criativa para outros. Para quem gosta de grandes canções e conhece bem o trabalho do artista, tanto faz. Ele que faça o que quer, ainda mais numa altura em que são os artistas a correr atrás de um público maioritariamente prepotente, que acha que liga para o 760-não-sei-o-quê e escolhe o alinhamento dos concertos. "People are crazy and times are strange".
Foi um concerto excelente, cravado de liberdade, de honestidade. Há quem se queixe que ele não dirige a palavra ao público. A sério? Letras de 4 páginas A4, galardoadas com um Nobel da Literatura não chegam? Ouves os versos de Ballad of a Thin Man e queres um Olá Lisboa?
O único factor negativo foi, como sempre e com todos os artistas, o som péssimo do espaço - o Pavilhão Gimnodesportivo de Lisboa/Altice Arena/Meo Arena/Pavilhão Atlântico muda de nome mas ninguém lá faz obras e o som é o mesmo de sempre - uma merda.
Destaco ainda os inícios dos temas numa espécie de cacofonia ao jeito de ensaio, em que um dos músicos começa eventualmente a tocar parte do tema que vai ser interpretado, mas no meio do caos, o público não consegue distinguir qual deles. Só a banda sabe. Dylan sempre foi mestre no culto da omissão.
Obrigado Sr. Dylan por continuares mais fresco e relevante que bandas de putos de 20 anos."


Claro que há vários tipos de público e num evento desta natureza, numa arena que leva tanta gente, haverá muitas pessoas com expectativas tão díspares quanto as suas personalidades e cultura musical, mas acho que há um problema grave de formação de públicos um pouco por todo o mundo.

Por mim, quando vou ver um concerto mas também quando oiço um novo álbum de um artista, mais do que decidir - e não imediatamente - se gosto ou não, tento apreciar a evolução da sua obra, contextualizar o que oiço com esse facto e principalmente aposto em interiorizar o que o artista tem para dar no momento, seja pela forma ou pelo conteúdo, desde as letras ao tipo de produção e sonoridade que apresenta. Mais técnica, menos técnica, mais alto menos alto, mais diferente ou mais comum face ao seu percurso... é uma questão de respeito!

Pode parecer 'off topic' mas gosto muito de Standup Comedy e há quem trabalhe nessa área, principalmente nos EUA (Bill Burr, Jim Jefferies...), que se queixa muito do público ao vivo e principalmente dos cromos dos blogs/tweets/etc. Esta malta mais nova (os millennials) está tão formatada e é tão conservadora que qualquer coisa ao vivo uns furos abaixo de um espectáculo tipo Beyoncé ou Timberlake ou que não tenha milhares de leds coloridos, vídeos arrojados, roupas provocantes, pirâmides de luz e o camandro, é alvo das mais selvagens críticas...

Epá, haja paciência para os haters ou alguém que os abrace com força e determinação, porque nitidamente estão com déficit de atenção e carinho! Bem, pode ser falta de mimo ou então de não terem levado umas semantas quando faziam birras em mais novos!

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